quinta-feira, 26 de agosto de 2010

COM MUITA PESQUISA, EIS O QUE APRENDEMOS

STRAIGHT EDGE: UMA FILOSOFIA DE VIDA
     O movimento straight edge teve início com uma banda de Washington D.C nos Estados Unidos. No livro Our Band Could Be Your Life, Ian MacKaye, vocalista da banda Teen Idles, conta que ele e seus amigos perdiam shows de suas bandas favoritas porque nas casas de shows que tocavam serviam bebidas alcoólicas e eles não eram autorizados a entrar.

     O Teen Idles fez uma turnê pela costa oeste americana em 1980. Em São Francisco, o dono do bar adotou a prática de marcar um grande “X” nas mãos dos adolescentes que não podiam consumir álcool. A banda achou a ideia interessantíssima.
     No retorno a Washington D.C, MacKaye e sua banda deram a sugestão a vários donos de bares e casas de show para que permitissem a participação de adolescentes na sua programação marcando-os com o “X”; este veio a se tornar o símbolo máximo de abstinência quanto a álcool e drogas no meio. O disco dos Teens Idles “Minor Disturbance” trazia duas mãos com o “X” na capa, marcando assim o início do que viria a ser a cena straight edge com o hardcore e o punk. E o “X” tornou-se então símbolo deste movimento.
     Não se sabe exatamente da onde veio o atual termo straight edge. Dizem por aí que foi a banda de hardcore Minor Threat que começou a utilizá-lo para caracterizar um modo de vida. Este estilo está bem explicitado nas músicas Out of Step e Straight Edge, da própria Minor Threat.
     Existem também evidências de que o termo foi usado para indicar um estilo de vida vegetariano ou vegano no século XX.
     Desconsiderando a dúvida quanto a sua origem, ‘straight edge’ basicamente significa careta. (straight é como uma coisa certa e edge é o limite, a borda de alguma coisa).

EM LINHAS GERAIS...
Os próprios straight edge dizem que Straight Edge é muito mais que uma tribo urbana ou uma conta-cultura. Dizem que é, na verdade, um estilo de vida. Uma filosofia a se seguir, com princípios e ideais característicos.
Defendem a total abstinência ao álcool, tabaco e às chamadas drogas ilícitas. A ideia surgiu com o início da cultura punk com jovens que simplesmente não viam a necessidade de alterar suas mentes com substâncias químicas para se divertir.
A maioria dos straight edge defende o princípio de que é possível ser contestador e rebelde sem o uso de álcool ou drogas. Defendem essa rebeldia que muitas vezes é relacionada a substâncias que alteram a mente sem se deixar cair em suas tentações. Quem adota esta postura procura uma forma de resistir à pressão social que incentiva o consumo de álcool, cigarro e drogas ilícitas.
Grande parte dos straight edge também escolhe por ser vegetariano ou vegano, ainda que muitos não vejam ligação entre seu ideal com estes dois outros citados anteriormente. Essa ligação surgiu mais ou menos em 1986, com a banda 'Youth of Today', que começou a defender a causa; isso foi se espalhando e hoje a maioria dos Straight Edge é vegano ou vegetariano. 
UMA PEQUENA OBSERVAÇÃO: diferença entre vegetarianismo e veganismo
Vegetarianismo: total abstinência à carne em geral (seja de boi, frango, peixe ou qualquer outra que exista).
Veganismo: total abstinência a qualquer substância derivada de animais (mel, ovo, leite, queijo etc, além da carne).


DO QUE É QUE O STRAIGHT EDGE GOSTA?
     O Straight Edge está totalmente infiltrado na cultura hardcore e punk. Seu visual é bem pesadão, com roupas pretas e tudo o mais. São facilmente identificados por suas várias tatuagens, piercings, alargadores e afins. Essas tatuagens são uma de suas formas de expressão; muitos straight edges tatuam um "X" na mão, e essa se tornou uma das principais marcas dos adeptos. Em uma visita ao centro de São Paulo, ao perguntarmos sobre eles, nos disseram:”Ah, não vai ser difícil de encontrar, são os mais tatuadões”. Pois é. A aparência assusta, mas a essência não dá medo nenhum. A maioria é contra o facismo e a homofobia e defendem valores mais humanos.

     Por trás de todo esse amor vem um estilo musical intenso e pesado. Muita gritaria, muitas guitarras, baterias e tudo o mais. O hardcore tem tudo a ver com os edgers. Por mais contraditório que isso possa parecer. Um pessoal que não curte drogas, álcool e afins tocando uma música extremamente pesada soa estranho. Mas essa é a principal mensagem dos edgers: mostrar que é possível ser louco sem depender de substâncias químicas.
     A maioria das bandas é internacional, nomes como: Teen Idles (os precursores do movimento), Minor Threat, G.I, Faith entre outras mais). Foram na verdade essas bandas as responsáveis pelo movimento ter se alastrado como fez. Suas letras dizem muito a respeito do estilo de vida straight edge e conseguiram passar a mensagem necessária para garantir muitos adeptos dessa filosofia livre de drogas e álcool.

UMA FESTA DIFERENTE:
O principal ponto de encontro da cena straight edge tem um nome: verduradas. Você deve estar pensando: “Mas que raio é isso?”. A ideia da coisa é mais interessante do que parece.
A Verdurada é um evento que mistura shows (na grande maioria das vezes de hardcore e punk) com outras atividades como palestras, exposições e vídeos sobre temas políticos, culturais, ecológicos ou que sejam considerados relevantes por algum motivo. Em alguns casos, existem estandes de comida vegetariana e vegan. Alguns princípios básicos da organização são o não consumo e/ou venda de álcool, cigarro ou drogas ilícitas, o “Faça Você Mesmo” (do inglês ‘do it yourself’), ou seja, a independência (nada de empresas ou patrocinadores por trás) e a auto-organização. Mostrando realmente o espírito do Straight Edge: engajado tanto ecologicamente como socialmente, livre de substâncias químicas e independente.



OS EDGERS DO MEU BRASIL:
     O movimento Straight Edge chegou ao Brasil aos poucos. Durante os anos 80, apesar de rara, a postura estava presente em alguns indivíduos dentro da cena punk. O primeiro registro de algo relacionado ao sXe no país é a foto da contracapa da coletânea “Grito Suburbano” (o primeiro disco punk lançado no Brasil, de 1982), do vocalista do Olho Seco com um “X” – o “X” – pintado na mão.

     Em 1989 foi formada em São Paulo a primeira banda Straight Edge nacional, o Energy Induct, que não chegou nem a gravar ou fazer shows. Um de seus membros fundou o fanzine e selo Liberation e integrou a banda Point of No Return.
     No entanto, os primeiros exemplos totalmente Straight Edge só apareceram em 1993 com as bandas Positive Minds e Personal Choice. Poucos anos depois, o Positive Minds se transformou no Self Conviction, outra banda fundamental no início de 1996.
     Conforme surgiam as bandas, os membros e amigos passaram a organizar shows independentes, evitando bares e casas noturnas e por vezes inserindo atividades culturais e políticas na programação. Esses eventos foram o passo inicial para o surgimento das já citadas anteriormente Verduradas.
     Em 1998 surgiu a banda Infect, formada por cinco garotas que tocavam um hardcore pesado, o que foi muito inovador para uma banda de somente garotas, porque naquela época era muito mais comum ver meninas tocando estilos musicais mais leves e sendo meigas e comportadas. O Infect tratava em suas letras de temas como direito ao aborto, vegetarianismo, Straight Edge entre outros, e teve muito destaque dentro da cena edger, tendo seu material lançado na Europa e nos Estados Unidos.
     Em 1999 surgiu no Rio de Janeiro a banda de hardcore Confronto. A banda se tornou o maior nome dentro da cena Straight Edge com shows por todo Brasil e quatro turnês pela Europa!
     E a cena sXe brasileira só tende a crescer e a conseguir cada vez mais adeptos...

As bandas Infect e Confronto, respectivamente
Video clipe da banda Confronto, considerada por muitos uma das melhores bandas hardcore do Brasil

QUERO CONHECER STRAIGHT EDGES!
Um ponto de encontro certo de edgers são as Verduradas. É a festa deles, é a praia deles, o lugar em que eles não dividem a atenção com mais ninguém. Mas é óbvio que nossos amigos não se escondem em casa até o dia dos eventos e ninguém mais os vê. Todo mundo tem o direito de uma vida social não é mesmo?
O Centro da cidade de São Paulo é um bom lugar para dar de cara com um straight edge.
A Galeria do Rock é onde se encontra de tudo e é ponto de encontro para alguns edgers. Existem lojas destinadas à eles ou ao vegetarianismo. Na verdade, tivemos uma experiência um tanto quanto desagradável em uma dessas lojas, a qual relatamos a seguir:



Chegamos à Galeria do Rock com a intenção de encontrar e conversar com alguns Straight Edges, trocar uma ideia sobre o movimento e ver no que dava. Chegamos cuidadosos e bem deslocados. As pessoas nos olhavam estranho: “quem são esses intrusos no ninho?”. Definitivamente não estávamos muito encaixadas nos padrões do lugar. De qualquer modo, seguimos em frente com esperança. Encontramos uma loja destinada aos Straight Edges, a qual sabíamos o dono ser também um Straight Edge. Ficamos olhando a vitrine, apreensivos. As pessoas dentro da loja nos encaravam. Criamos coragem e resolvemos entrar. Dois homens tatuados que estavam lá dentro saíram no momento em que pusemos nossos pés dentro do estabelecimento. Ficaram então o dono e um amigo de cabelo vermelho. “Você é Straight Edge?”- foi o que perguntamos de cara, era tudo ou nada. “Sou” – ele respondeu. “Estamos fazendo um trabalho de escola sobre tribos urbanas e nos interessamos pelos sXe, será que você podia nos ajudar?”. E com um risinho debochado ele simplesmente respondeu: “Não.” Um tanto quanto traumatizante, para ser o mais honesta possível.
Após esse traumático primeiro encontro, voltamos à Galeria do Rock em busca de um contato mais simpático. Ficamos até um pouco intrigadas com o fato de os Straight Edges defenderem a igualdade de direitos e o respeito entre as pessoas e um representante do movimento ter nos tratado dessa forma. Nessa nova visita acabamos descobrindo que nosso trauma foi causado por um trauma do próprio vendedor. Explicando: um amigo dele uma vez havia sido entrevistado, e sua entrevista foi editada de tal forma a deixar a impressão de que os edgers eram pessoas totalmente diferentes do que realmente são. Explicado, desculpado. Na realidade, em nossa segunda tentativa de contato, Cris - o vendedor traumatizado - se mostrou muito prestativo ao nos indicar novos locais nos quais poderíamos encontrar Straight Edges. Vejam o produto desse novo encontro muito menos traumático:



Um ponto de encontro diferenciado é a Sorveteria Soroko, localizada no número 505 da Rua Augusta. Os sorvetes de lá são feitos à base de leite de soja, ou seja, são destinados ao público que não consome leite de vaca; como muitos edgers também são adeptos do veganismo pode-se encontrá-los por lá. Todos os dias os sorvetes são feitos manualmente pelos simpaticíssimos donos do estabelecimento. Vale à pena.

Na foto, Sr. Soroko, dono do estabelecimento e super simpático!

ANALISANDO: O QUE ELES TÊM A DIZER?
MÚSICA “SxE But Not An Asshole” da banda Betercore.

Essa letra representa justamente o sentimento Straight Edge: sem preconceito, sem julgamentos, sem repressão. Existe um respeito enorme com as outras culturas, desde que todos se respeitem também. “Você não vê que é tudo pessoal”, cada um tem suas próprias escolhas e isso não quer dizer que nenhuma seja mais correta do que a outra. Cada um é cada um e tem seus próprios gostos e ideias. Não é certo julgar alguém somente pelo que ela faz ou deixa de fazer, mas deve-se valorizar o que a pessoa realmente é. O que está dentro é o que realmente importa, e somos todos livres para tomarmos nossas próprias decisões. Não existe espaço para preconceitos tão estúpidos e infantis. E o pensamente sXe se baseia principalmente nisso: não julgue os outros apenas porque eles são diferentes. É preciso conviver com as diferenças e aprender com isso. Cada um pode acreditar no que quiser, desde que haja respeito com o próximo.

TRIBO URBANA: SERÁ QUE É?
Vistos de fora os Straight Edge são sim considerados uma tribo urbana. Possuem os mesmo ideais, defendem os mesmos valores – alguns mais que outros, mas de qualquer modo são os mesmos -, vestem as mesmas roupas, se tatuam bastante no geral como uma forma de expressão, escutam as mesmas músicas... Mas o que será que eles próprios sXe pensam sobre esse “rótulo” de Tribo Urbana?
Os Straight Edge não se consideram uma tribo urbana, e sim uma maneira de viver. Alguns afirmam até que não existem membros do sXe, apenas adeptos desta ideia, sendo uma forma de enxergar o punk/hardcore e a própria vida. As palavras mais utilizadas pelos adeptos para expressar todo o movimento são: ideologia, lema, filosofia de vida e coisas do gênero.
Podemos chegar a conclusão que de fora os Straight Edge nos parecem uma tribo urbana, com o tanto de coisas que um tem em comum com o outro. Mas aos seus próprios olhos, preferem não se rotular. É um pouco confuso, e até contraditório, mas cada um entende as coisas do jeito que quer. Acaba resultando em uma pergunta sem resposta. Os edgers tanto são quanto não são uma Tribo Urbana, é tudo dependente de ponto de vista. E isso, cada um tem o seu.



E O QUE TIRAMOS DE TODA ESSA EXPERIÊNCIA?
     Essa última parte de reflexão é totalmente independente de pesquisa e cem por cento pessoal. O que aprendemos com tudo isso e do que isso nos foi útil?
     Encaramos essa jornada pura e academicamente; sim, não tínhamos nenhum outro maior interesse além de cumprir com nossas atividades escolares. Mas com o tempo as coisas mudam, a gente recebe novas informações e vamos formando opiniões diferentes.
     Para elaborarmos esse trabalho tivemos que penetrar no mundo straight edge, sair do lado de fora e começar a enxergar as coisas da própria maneira deles. Éramos antes a gente do "outro lado" e tudo o que enxergávamos era filtrado na nossa cortininha de estrangeiros que não sabem de nada e vivem cheios de pré conceitos. E percebendo isso, enxergamos que não somente nessa experiência fomos despidos do preconceito, mas que em todas as coisas da nossa vida enxergamos o lado de fora com nossos olhares de estranhamento. Então pudemos questionar: "será que é tão estranho assim?". Coisas que para nós soam tão esquisitas, são a realidade, o cotidiano de outros. E é engraçado o quanto podemos aprender nos despindo dessas visões distorcidas.
     Temos que admitir, é verdade, que não é possível deixar todos os preconceitos de lado de uma hora para outra. Mas só de percebermos que o modo que enxergamos é que pode ser o modo distorcido, já nos faz querer mudar e passar a enxergar o mundo com pureza. Enxergar com curiosidade boa, e não com o estranhamento.
     Pudemos perceber que pessoas as quais julgávamos tão assustadoramente diferentes podem ser mais parecidas do que imaginávamos. São dessas coisas que a vida é feita: surpresas. E depois de muito trabalho tivemos uma surpresa boa. E por mais clichê que isso possa soar: é preciso aceitar as diferenças, porque no fundo somos todos iguais.

Quem somos nós e o que fazemos aqui?

Somos seis alunas de colegial fazendo um trabalho de Sociologia sobre Tribos Urbanas. Nos interessamos pelos Straight Edge e cá estamos nós. Tivemos que mergulhar no movimento e nos virar atrás de informações.
Não sabemos de tudo, é claro. Mas fizemos e fazemos nosso melhor para dar o melhor.

















X,
Maria Elisa Savaget, Carolina Kalili, Carolina Motta, Carolina Nascimento, Michelle Kaloussieh, Noemi Sunago e Mariana Salerno - ESCOLA LOURENÇO CASTANHO